terça-feira, outubro 24, 2006

A arte - Martin Munkácsi, Museu Martin Gropius Bau em Berlim








Think while you shoot, o conceito do Martin Munkácsi.

Para muitos, incluindo Bruce Weber, Richard Avedon e inclusivamente Henri Cartier-Bresson, Martin Munkácsi (1986-1963), fotógrafo húngaro, foi o percursor da fotografia moderna, sobretudo, do foto-jornalismo e da fotografia de moda.

Para mim, confesso, era um ilustre desconhecido – conhecia as suas fotografias mais famosas, sem saber que eram dele -, até o ter descoberto no Museu Martin Gropius Baú, em Berlim, há cerca de quinze dias atrás, numa exposição retrospectiva da sua obra. Uma verdadeira revelação.

Martin Munkácsi, na vanguarda ao seu tempo, relativamente a fotografia de moda, optou por captar os movimentos naturais dos modelos, subvertendo a regra das poses estáticas, feitas para resultar previsivelmente, o que revolucionou a abordagem; e na vanguarda também do foto-jornalismo,
Three Boys at Lake Tanganyika, uma das coisas que eu conhecia (como confessei, desconhecendo a autoria), fala por si e marca indubitavelmente o nascimento do género. Ter tido o prazer de a ver, em Berlim, emocionou-me e muito.

Já agora, aproveito e cito, em inglês, as palavras de Cartier-Bresson sobre a Three Boys:

«I suddenly understood that photography can fix eternity in a moment. It is the only photo that influenced me. There is such intensity in this image, such spontaneity, such joie de vivre, such miraculousness, that even today it still bowls me over.»

Sendo uma retrospectiva muito completa da obra de Munkácsi, devo dizer que o que vi, genialidades atrás de genialidades, constituiu um dos momentos top culturais deste ano.


Abílio Neto

sexta-feira, outubro 13, 2006

O livro - Um Novo Mundo Feliz, Ulrich Beck




A tese é muito simples: o mercado laboral europeu tendencialmente está a aproximar-se dos mercados laborais do «3º mundo», no qual a precariedade do vínculo é a nota dominante, sendo o Brasil apresentado como case study.
Por isso, julga, e bem, o autor que o Welfare State está condenado, o que poderá levar, muito provavelmente, a condenação da própria democracia de cariz assistencial, conforme se conhece hoje.
Um diagnóstico mais ou menos conhecido, mas difícil de trabalhar, em termos, de alternativas à actual situação. Para a Direita, sem visão, está bem que a coisa vá nesse sentido; para a Esquerda, também sem visão, está bem que a coisa fique como está; e depois, há a outra Esquerda, a do Ulrich Beck (UB), que sugere novos caminhos, propondo rupturas e apresentando indicações do que se poderá fazer para obviar o inevitável.
No ensaio principal, UB, aprofunda, uma vez mais, a sua análise, sob o enfoque no mundo laboral, ao conceito de Sociedade de Risco, a sociedade actual, chocando a velha Europa com o novo Brasil, mas deixando espaço para que outros ensaistas joguem o mesmo jogo no seu campo, apelando a sua territorialidade específica, EUA, Ásia e África.
O giro é que o UB e os outros autores, fundamentalmente, utilizam o conceito de Sociedade Civil para responder a questões que são colocadas pelo mercado, ou seja, trazem um conceito político, muito pensado para a cidadania, para a arena do competitivo mercado laboral. Mixa. Muitas das soluções propostas sugerem que o futuro passa por uma profunda articulação entre o mercado (como o conhecemos hoje, não, não sonhem com outro mercado), Sociedade Civil (virada para a prestação de serviços, permitindo assim e também que a cidadania seja realizável com dignidade), empresas (sempre com contratos precários e sub-contratos a micro empresas saídas de associações de desempregados ou de trabalhadores precários ou de especialistas) e o Estado (levezinho, à Liedson, esforçado, mas eficaz e mais promotor e regulador do que interventor, mas não desresponsabilizado, um Estado que marque golos).
Gosto da proposta, sobretudo, durmo bem com a ideia da liberalização do conceito da Sociedade Civil.
Esse livro é obrigatório para todos aqueles que se preocupem com a temática, ou melhor, é obrigatório para toda gente que saiba ler.
Citações:

«A utopia neo-liberal é uma forma de analfabetismo democrático. O mercado, como tal, não é portador da sua própria justificação. Este sistema só é viável em alternância com a segurança material, os direitos assistenciais e a democracia: numa palavra, com o Estado democrático.»

«O presente necessita da antitese para esclarecer até onde pode chegar a sua pretensão de domínio, o mesmo é dizer, para esclarecer onde pode começar outra coisa.»

«O conceito de modernização reflexiva aponta a uma série de mudanças radicais fruto da aceleração e radicalização da modernização (...) Não há novas élites surgidas de baixo, nem novas utopias sociais, nem frentes claras de conflitos; ao contrário.»

«Modernização reflexiva significa passar da 1ª modernidade, encerrada nos limites do estado-nação, para uma 2ª modernidade (aberta e arriscada) de insegurança generalizada.»

«Empresas grandes e pequenas, empresários autónomos e multinacioanis..., se querem ser activos globalmente, têm que cumprir um requisito: desenvolver uma estratégia de localização. A globalização pressupõe localização, mas com uma conotação socio-espacial, no sentido de que o que antes tinha que estar ligado aum lugar concreto, pode expandir-se a nivel mundial e, não obstante, seguir sendo uma unidade cooperativa.»

«Enquanto as correntes de capital podem mover-se por todo o mundo, através de meios electronicos, atravessando fronteiras a velocidade da luz, a mobilidade dos trabalhadores está fortemente limitada pela sua vinculação a família, ao lugar, as instituições, ao direito, a cultura, a política, aos movimentos proteccionistas e também pelo ódio ao estrangeiro.»

«A vinculação territorial do trabalho põe a população trabalhadora em desvantagem na repartição dos riscos globais da globalização.»
In, Un nuevo mundo feliz, Ulrich Beck, Editorial Paidós
Abílio Neto